Hoje de manhã,
enquanto eu andava pelas ruas do centro cansado e chateado, esbarrei
com você em uma calçada. Você parecia apressada e realmente fingiu
que não me viu, enquanto eu fiquei completamente atônito observando
você caminhar até dobrar a esquina.
Eu me atreveria dizer,
mesmo fazendo da coisa muito menor do que ela é, que foi estranho,
mas não foi.
Foi horrivelmente
familiar, como tomar uma injeção; você sabe que aquilo não te
mataria, mas você também sabe que não gostaria de passar pela
experiência se possível.
Pois é, te ver sempre
é assim, horrível e doloroso. Principalmente porque, quando te vejo
por aí, tudo parece ficar em câmera lenta, meu estômago revira e
dá uma vontade de correr para te abraçar, senão para fugir de você
que nem querendo você imaginaria.
E lá se foram todas as
minhas ideias naquele encontro, e aconteceu o que sempre acontece se
eu te vejo: comecei a escrever poemas bobos de amor sobre coisas que
não aconteceram. É sempre assim, gasto linhas e linhas escrevendo
coisas que você não lerá e passo o resto do dia cansado e chateado
tentando pensar que, por mais hipócrita que esta afirmação possa
ser, a nossa vida continua.
Sabe, logo quando
deixamos de nos ver, eu pensei que morreria, e eu quis mesmo morrer,
quis muito.
Mas eu
sobrevivi...acho...
Sobrevivi porque
aparentemente esta é a maior habilidade que possuo, me levar adiante
contra todas as possibilidades, como uma verdadeira zebra do
existencialismo, mas tem mais aí.
Eu sobrevivi não
porque tivesse vontade de viver sem você, mas porque eu precisava
ter certeza de que você continuaria -coisa que me era óbvia,- bem
como pela necessidade de ver que você seguia; de saber que estava
bem e feliz com um novo namorado ou, quem sabe, qualquer outra
conquista que cercasse a sua vida.
Sobrevivi para ver você
crescer, desabrochar como ser humano e ter uma plenitude que não
atrevo a imaginar desde o dia em que aceitei viver à sombra da tua
ausência.
O fato é que, depois
que eu te vi, meu dia mudou de cor e eu comecei a repensar várias
coisas sobre mim e sobre a minha vida; Comecei a pensar no porque de
eu não conseguir simplesmente ver você e falar sobre tudo o que eu
realmente considero importante.
Eu comecei a pensar no
quanto nós tornamos nossa vida limitada baseada em decisões que
tomamos não só por nós, mas pelos outros e por tudo que deveria
ser fácil e nós tornamos difícil.
Depois do nosso
encontro de hoje de manhã, me ficou ainda mais claro que essa vida
de insatisfações que vivemos é uma piada mal contada, e que é
fato que existe algo de inexplicável entre mim e a possibilidade de
de aceitar a vida como uma vitrine bonita que eu fico olhando de
fora.
Continuei com a cabeça
fervendo enquanto caminhava. Entrei em uma pequena loja, pedi para
usar o banheiro e, uma vez lá dentro, chorei, mas chorei muito, como
nem mais lembrava que podia.
Chorei com os soluços
abafados pelas mãos sobre a boca e a cabeça mal encostada naquela
parede suja, chorei.
Depois disso foi lavar
o rosto, sair do banheiro e voltar para o mundo; voltar para tudo
isso que transpira egoísmo e maldade recontando a mentira cotidiana
e compartilhada.
Depois disso, foi
voltar a caminhar, e fazer a cada quinze passos uma oração para não
te ver mais hoje e outra para te ver bem amanhã.
Depois disso, viver
parecia parecia só viver e nada mais.
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