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sábado, 4 de novembro de 2017

Para "Reh"

Ei, eu digo, “hey”, Quanta coisa aconteceu! Eu não sei por onde começar, mas eu quero dizer coisas e elas são tantas…
Eu não saberia dizer tudo meu bem, eu nunca soube dizer tudo. Eu me enrolo todo com as palavras,  falo demais; Eu quero falar da “vida, universo e tudo mais”, mas ei...
Eu quero falar só pra você.
Eu quero te falar sobre coisas que eu acho incríveis, sobre o pôr do sol, sobre aquela vez que eu pulei na piscina usando terno; Eu quero falar sobre as coisas que você adora e quero que você me conheça enquanto me conta sobre você. Eu quero falar sobre quadrinhos, músicas, filmes e provavelmente nunca farei isso. Mas que tolice, não?
Eu quero me deitar na sala com o telefone na orelha, porque a sua voz faz cócegas no meu cérebro, e eu rio. Eu quero falar contigo, porque em alguns dias eu aprendi mais contigo do que com a porção de pessoas que vive me cercando. Eu agora repito as coisas que você me disse o tempo todo, e eu repito pra não pensar que você não está por perto, que não nos falamos mais de nenhuma forma, por mais idiota que isso me pareça.
Eu não sou insistente; Nunca amei nada que não tenha partido meu coração mais de uma vez. Não me lembro qual foi a última vez que eu quis trazer alguém de volta pra minha vida, e eu queria poder te explicar sem me perder que, de alguma forma, você me ligou a um passado onde as coisas eram boas e eu não poderia ser mais feliz. Sua voz e o jeito que você falava comigo me fizeram lembrar de quando eu era criança, onde tudo era mais simples, e eu só precisava dizer “ei, fica firme, porque a gente está junto nessa”.
Eu acreditei em você, da forma mais inocente, como as crianças fazem. Eu te quis só por querer e fui feliz sabendo que você respirava; Sem cobranças, sem pretensões. Eu te quis por tudo, pela tua história, pelo jeito desordenado que colocava os fatos e pela força que a sua voz transpirava, por mais doce que ela me soasse. Acreditei que você pudesse realmente ser alguém com quem eu pudesse falar de qualquer coisa e ser eu. Eu quis escrever sobre você, e cada palavra que saiu de mim nos últimos vinte dias falava de ti de algum jeito, como se tudo no mundo girasse agora em torno de outro sol; como se um portal para um lugar melhor existisse e você pudesse exatamente me conduzir a algo que perdi no decorrer dos anos.
Não entenda errado, eu posso perfeitamente decidir que vou parar de pensar em ti, que você é uma ilusão agradável que me ajudava a passar o desconforto desses dias de tédio, mas ei, você não é. Você é tão mais que não caberia em poemas ou em cartas de desculpa; Você tem um gosto que me dá vontade de te fazer elogios, gosta de cinema, vampiros, Star wars e Michael Jackson; Você se abre pra tudo e quer de tudo um pouco, você toca violão e adora as minhas bandas preferidas e você chora quando fala das suas dores; E meu deus, não repare no meu choque, mas eu não conheço ninguém tão real e tão linda em tantos sentidos e claro que isso me assusta.
A verdade é que posso perfeitamente aceitar e conviver com a ideia de que não nos falaremos mais, que existem outras pessoas incríveis entre esses sete bilhões que circulam feito formiguinhas arrogantes por aí, brincando de ser o centro do universo; Que amanhã é um outro dia e que segunda eu não tenho a menor ideia de como vai ser, mas eu tenho que dizer o quanto eu tenho pensado em ti; Que, embora seja provável que você nunca leia isso, te conhecer foi como ver parado em algum lugar do tempo e espaço uma imagem de algo valeria a pena amar, seja lá em que sentido fosse; E eu te amei, quietinho, sem pretensões; Como quem ama algo perfeito e distante; Eu só te amei, por menos que tenha dito... Amei.


Eu te deixo sumir da minha vida, mas eu sinto a sua falta, e eu não sinto falta de quase nada hoje em dia.

sexta-feira, 29 de novembro de 2013

Gentileza

        Gentil: Essa é sempre a primeira palavra que me salta à língua quando você me vem à memória. Foram incontáveis as vezes que você me tratou bem, que acariciou o meu cabelo pra tentar me deixar menos chateada com algo; que me poupou de verdades dolorosas com palavras de carinho; as vezes que me pagou o almoço ou que saltou à minha frente apenas para me abrir uma porta ou puxar uma cadeira. Você realmente chegava a parecer bobo de tão bonzinho que era, e você era muita coisa, mas principalmente gentil.
        Lembro que toda noite você andava uma distância enorme apenas para me acompanhar até a minha casa, e não importava o quanto eu te enxotasse, você continuava ali, caminhando ao meu lado, como se quisesse ter certeza de que eu chegaria bem ao meu destino. Naquele caminho você sacrificou incontáveis chocolates comigo, a despeito do meu horror de ficar gorda por qualquer coisa que eu comesse. -Gentil-; acho que a palavra me veio à cabeça quando lembrei de você me dizendo que não importava quantas toneladas eu comesse, sempre estaria linda. Gentil, um doce tão sensível quanto a textura dos chocolates que se derretiam na minha boca. Gentil.
        Eu lembro de tudo que cercava aqueles dias corridos. Da sua coragem de dizer coisas em alto e bom som que ninguém mais se atreveria; da sua risada honesta e do jeito nervoso que você ficava quando tinha que defender seu pensamento perante outras pessoas; eu me lembro de você tentando me ensinar sobre filosofia e gramática e realmente não tenho como esquecer certos momentos que, apesar de estranhos, escondiam algo de indubitavelmente grandioso. Das lições de abnegação e boa vontade aliadas ao seu pavio curto inerente quanto às coisas que você achava absurdas. Lembro-me que você costumava dizer que tinha nascido no século errado e que, se pudesse escolher um tempo e lugar para vir ao mundo, este certamente teria sido o Japão feudal onde você de certo seria um samurai, ou um camponês linguarudo de vida curta. “Desmiolado”, eu pensava, mas sem dúvida, nobre e... gentil.
        Hoje eu pergunto onde você anda; se está bem, se ainda sorri do mesmo jeito e se ainda fala as mesmas maluquices de sempre; pergunto-me se você ainda acha que dinheiro não é assim tão importante ou mesmo se você ainda vive tentando “salvar a sua alma”, como você costumava dizer. Pergunto-me também se outra garota está do seu lado e se você entrega a ela tudo o que uma vez me ofereceu entre soluços e lágrimas, e que recusei nessa mesma condição. Realmente me questiono muito sobre o seu atual estado e sobre como a vida transcorreu. Devo confessar que sem você passei um tempo me sentindo, de fato, uma legítima obesa, e eu sei que você riria ao ouvir isso.
        Sabe, as questões sobre você são muitas, mas, de todas elas só uma não me deixa dúvida: não importa o que tenha mudado, eu sei que uma coisa em você não muda, e apesar de eu ter descoberto isso no dia em que parti seu coração, sei que você continua gentil.




terça-feira, 13 de agosto de 2013

O hipócrita e o vício

               Eu escrevo; eu lembro teu nome e escrevo; as gotas de suor me caem pelos olhos que mantenho abertos, enquanto o meu hálito embaça o vidro do espelho, e eu? Eu escrevo. Não sei se para me desculpar comigo ou contigo por tudo aquilo que fizemos ou deixamos de fazer; não sei se para chamar a tua atenção para o nome do meu gato de estimação que só me tem trazido desgostos (Deus, deve haver alguma razão para isto tudo…), eu não sei, eu realmente não tenho entendido se escrevo para evocar o teu ou o meu fantasma, ou se o tenho feito apenas para reviver uma velha dor com ares novos, eu não sei.
                Queres saber do que sei? Bem, sei pouco; no mais, sei de mim. Não que isto me tenha impedido de saber do teu novo endereço; não que isto tenha me cegado para as mudanças da nação ou insensibilizado para o raro cheiro de chuva no ar das noites do mês passado. Eu sei que o dólar anda em alta e que a União européia não passa de um blefe continental com um prazo de validade definido pela inveja da vizinhança; mas olha, eu ainda falo demais mesmo, e pior! Tenho o mau hábito de realmente acreditar nas coisas que digo, provavelmente por acreditar -com uma comovente inocência- no fato de que ainda sei o que é a verdade e como me valer dela.
 Mas é isso mesmo, não tem realmente nada a ver com o que aconteceu, mas sim com as coisas como eu me lembro. Não importam os cheiros, os gostos as sombras dos becos, as luzes da cidade… porque, em algum ponto, a infidelidade da memória trairá a todos nós e no mais é isso: uma maldita série de imagens mal desenhadas que me dizem que algum dia houve algo bom e que este algo bom está intimamente ligado ao suor dos corpos e toques íntimos, partindo da língua até o dedão do pé. Era tudo nosso, era tudo exuberantemente ardente e, agora, sequer consigo lembrar o teu rosto.

                Pois sim, eu ainda escrevo, e hoje, quando olhei o espelho tentando abolir todas as hipocrisias remanescentes de minha vida, percebi -além da ascensão de minha calva- que continuo sendo um hipócrita e amanhã não devo amanhecer muito melhor; notei que ainda escuto as mesmas musicas, uso as mesmas roupas amassadas e gastas -sempre o mesmo preto amarronzado- e, quanto a isso, é engraçado lembrar de ter me aventurado em outros tons. Eu continuo desleixado e preguiçoso, alimentando o mesmo gato gordo de defeitos idênticos, que não deixa de me fazer pensar que ele sim ainda conserva alguma classe. E por fim, o pior foi entender que, apesar de não querer lembrar coisa alguma, escrevo para não me permitir esquecer.

sexta-feira, 12 de julho de 2013

O poeta e a princesa evanescente de lugar nenhum

        Quanta teimosia, quanta displicência de minha parte te mimar assim com tanto afeto, tanto poder sobre mim; tanto de coisas que normalmente não se entrega. É que, muitas vezes, não sei se existes ou se finges existir estando comigo. Te vejo longe, intocável; desafiando e assustando os corações à tua volta; tudo acidentalmente, sem cálculo ou senso do chão que pisas, tão pouco do barulho feito pelas vontades sobre as quais os teus pés recaem; tudo tolo demais, ingênuo demais, doloroso demais para quem ousa assistir ou viver a cena.
        Azar o meu precisar te olhar de perto, dizer coisas que ninguém ousa, te desafiar a ser maior que isso tudo; vaidade minha esperar que me acates, que entendas, que enxergues o quanto quero para ti algo além dos quilômetros de distância escondidos nos teus olhos pequenos e na tua boca de sorriso desajeitado. Azar o meu, azar o meu… sabes, é que de repente já nem sei o que me deu pra querer te falar dessas coisas, de desenfrear-me a falar do calor que faz lá fora e do gelo que eu sinto aqui dentro. Quanta audácia esperar que me esquentes, que me mudes o coração ou que me cales a boca. Pois não, não e não: De nada sabes e a nada te entregas, e eu fico te olhando, fazendo orações sem fé, rituais sem crença aos meus próprios deuses; eu choro, soluço e faço barulho, para depois de tudo isso me mal fadar a perguntar com um aperto no peito e uma cara de desespero: Onde estás? Porque não trocas essas piscadelas de brilho fosco por um real sinal de vida, deixando de ser esse fantasma semi-animado, essa princesa sem castelo e sem porte que parece ter bebido lágrimas até a ascender à ebriedade infinita?

        Princesinha, salte, salte comigo sem medo da queda, pois prometo proteger o seu belo narizinho –só para que possas apontá-lo para qualquer lado- Prometo que te ensino a ver o outro lado da vida, prometo te arrancar dessa moldura e te mostrar os mundos além do mundo; prometo te ensinar sobre amor, e sobre o horror que pode ser descobrir-se embriagado de si mesmo, apaixonado por coisas que sempre estarão do lado de dentro da fronteira dos sonhos. Sem príncipes ou sapos; sem grandes ou pequenas coisas sopradas em alguns ouvidos e cuspidas de boca em boca. Saltes que te prometo o caminho para a fada azul, o caminho para fazer fatos as tuas próprias verdades e, quem sabe, descobrir-se real depois de entender o grande engano em achar que a realidade faz-se, apenas, de dentro para fora.

terça-feira, 10 de abril de 2012

O triste poema do gênio passional

Sou um cretino, escrevo sobre o mundo,
A vida, galaxias inteiras;
Sobre a fome no nordeste e a violência no centro-oeste;
Falo de cinema, literatura e outras formas de arte;
Sobre modelos socioeconômicos e políticos
E...sou um cretino, talvez o pior deles.
Escrevo sobre bondade e humanidade;
Travo debates sobre Platão com Hedgar;
Falo de jogos, desenhos e coisas da pós-adolescência.
Sabe, eu falo, escrevo, falo...
E o tempo todo o meu peito está apertado,
E eu acho que nunca poderei mesmo pensar nessas coisas
Como deveria
Porque, sempre que quero mesmo pensar,
Me vem a frase de sempre:
“Na verdade a gente nunca mais se vê...”
E me bate um amargo na boca com uma descrença na vida...
Sou um cretino que passa muito tempo com a boca aberta,
Falando no piloto automático,
E estou sempre preocupado com o fato de que,
Embora te veja sempre, já não te veja mais.
E eu quero ser cidadão do mundo,
Mudar o conceito de humanidade,
Dar um jeito na política e pobreza...
Mas sou um cretino que não pode mudar nem mesmo
O peso da tua ausência presente sobre a própria alma.
E eu sigo o molde, me misturo...
Eu estou sempre entre as pessoas.
Sigo achando-as adoravelmente simplórias
E até fico feliz por isso.
Mas sou um cretino, e gente como eu não pode se dar
Ao luxo de ser feliz muito tempo
(Embora possa fingir- para sempre- se preciso for).
Claro que sabes dessa minha cretinice! Por que outro motivo
Me seria tão distante?
No dia em que sentei à tua porta porta para pedir desculpas
acabou que não saíste o “tu” que eu esperava,
E eu segui de lá para cá remoendo,
Como quem come grãos de café com água de boldo.
A verdade é que, passe o tempo que passe,
Para mim tudo foi ontem.
E eu não consigo pensar no mundo quando lembro
Que você caminha nele.
E foi só um beijo, não foi?
-Não, não foi, não e não!-
Outras bocas depois da tua boca;
Outros corpos depois do teu corpo pequeno,
Cheirando a sexo e doce.
Plutão não é mais um planeta sabia?
Mas sim, minha cretinice é notória e eu tenho
O mau hábito de escrever como penso e rezar
Para que soe como falo.
Eu deveria pensar o universo,
Ascender às alturas em quadros e quadros de
Equações sobre a física quântica,
No entanto, sempre que rabisco sobre o assunto, acabo
Esbarrando em qualquer dimensão onde estamos juntos;
Onde não foi só um beijo louco e roubado;
Onde nossos filhos são lindos e inteligentes,
Leem Voltaire e tocam violino.
Ou onde vamos juntos ao cinema, ou a qualquer
Outro lugar felizes, e onde a força das circunstâncias
Não permita que sumas para sempre da minha vista,
ficando apenas em minha memória e em um punhado
De "cartas-poema" inúteis e choronas,
Como tanto me envergonho de ser.
Eu deveria estar mudando a minha vida, mudando o mundo;
Fazendo algo realmente importante...
Mas eu não vou, porque sou cretino.
E não vou principalmente porque,
Quando eu queria mudar o mundo,
Todos os meus planos passavam por você de alguma forma.
Sem você -para sempre e sempre-
Perdi todas as razões para tentar mudar a mim mesmo
E agora só quero dormir o sono redentor dos cretinos
Que nem sabem o que são.

quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

Aos gentis e carentes, com todo amor que me resta

         Quero de volta a minha vontade de dizer, de expressar com força a minha opinião, aquela gana para falar de mim como quem sabe e não como quem pensa que esqueceu os detalhes quando são eles que fazem a diferença.
        Eu quero o troco. Quero, eu sei, porque já paguei caro demais pelas coisas que não ganhei.
Dura estrada espinhenta,
Canto rouco em verso e prosa;
Sigo sempre em marcha lenta,
Deixo aos espinhos sangue para a rosa.
         Eu vou, eu sou durão. Sou muito teimoso para admitir qualquer lógica que me separe dos sonhos.
Os sonhos são o que resta; O mundo é um retrato velho jogado na água e todo dia eu subo à superfície para respirar.
Quem sabe se um dia eu não arrasto o mundo comigo e o meu povo respira?
Quem sabe eu não trago à tona o Brasil de poetas sem teto que passam fome e amam os livros?
Quem sabe eu não possa mostrar que na irmandade da mendicância há muito mais poesia do que na fartura de quem se basta?
         Eu preciso é dos miseráveis e dos animais doentes, dessa gente triste e sorridente que ocorre por todos os cantos da minha realidade...
Sabe o que eu descobri? Com esses é que tenho irmandade, e para esses eu canto!
Rouco, louco...
Muito ou pouco!
Vou rimar quando me der na telha e dizer o que preciso que saibam nas elites considerando toda forma de expressão, porque eu sou outra voz dos desfortunados e sei que eles precisam não da minha poesia, mas de qualquer poesia que seja para seguir em frente.
         Quem sabe não ajudo a puxar o quadro velho e faço do mundo um lugar enfestado de loucos inofensivos e apaixonados, inebriados pela graça e beleza dos clows shakespearianos?
Quem sabe não ensino a certos homens que não é preciso ser santo, apenas bom o bastante?
Quem sabe um dia alguém não gritará alto meu nome dizendo-me herói de qualquer nobre cruzada, não em nome de qualquer deus, mas em nome do fim da covardia e do esquecimento dos quais há tantas vitimas?
         Ah meus amigos, venham comigo, falem exatamente o querem falar, o que precisa ser dito.
Eu apagarei, vocês apagarão. Somos cigarros nas mãos do tempo, queimando devagarinho; morrendo dia após dia, esperando para ser feliz depois, quando a casa da certeza é o agora.
Eu não vou mudar o mundo, eu sei disso, mas eu vou morrer tentando e se alguém vier comigo tudo vai ter valido a pena; Eu não terei sonhado sozinho, gritado sozinho, enlouquecido de amor pelas coisas, pelos necessitados e gentis sozinho.
         A minha alma vai nos versos e eu deixo neles o meu legado, prova de que os carentes de sorriso largo tem alguém que os ama, que os bichinhos famintos e inocentes tem alguém que pensa neles e, enquanto eu puder, subirei à superfície para respirar cantando para mim, para eles e para todos os que sentem como eu a necessidade de um quadro novo e de um mundo melhor.

quarta-feira, 23 de novembro de 2011

Sobre cachinhos, escolhas e minha inadequação...


         Me deixo cair na cama. Estou tão cansado de tanta coisa que dificilmente teria disposição para listar detalhadamente o que me aflige ou falar do sufoco que é dar um sorriso. Eu nunca soube mesmo estar de cara amarrada e isso para quem me conhece não é lá algo muito surpreendente. Entretanto, justamente para não expôr ninguém a um turbilhão de emoções de caráter duvidoso, achei que deveria fazer o máximo possível para me manter um tanto apagado, distante, em certo estado de anestesia.
         Tem música tocando lá fora, música vulgar que fala de como somos engraçados e ligados diretamente ao que o padrão social nos pede. Eu venho fugindo disso faz anos...Eu não quero me encaixar, não quero ser assim rotulável, igualzinho, usando terno e gravata e tendo um cabelo de cidadão respeitável. Antes a bagunça dos meus cachinhos e o caos dos meus pensamentos. Antes a dor de entender exatamente o que não desejo ser e a sobriedade de olhar o mundo como quem observa de uma janela alta.
         Eu tenho observado as pessoas. Sabe, a maioria pensa que a vida é simplesmente um estado de adequação às coisas: “Nasça, cresça, estude, arrume um bom emprego, tenha uma namorada, constitua família, se adeque, faça parte de algo...” entretanto, a maioria das pessoas ignora o fato de que é profunda e irremediavelmente infeliz usando desculpas de terno gravata para não fazer o que suas almas pedem.
         Eu conheço advogados que queriam ser músicos, contadores que queriam ser atores, professores que um dia sonharam em contemplar a existência e hoje, entretanto, estão levando uma vida que as vezes parece não ser sua... Isso me chateia muito. Sabe, e eu nem consigo falar daqueles a quem os muros da ignorância e injustiça privam da liberdade de pelo menos entender o que querem; Nem consigo falar dos analfabetos e miseráveis, eu nem sei mais falar...
         O que eu sei e pretendo deixar claro para quem ler isto é que vivemos uma só vez, e se não pudermos fazer da nossa vida algo de que gostemos, pelo menos em alguns pontos, devemos parar e ver para quê estamos vivendo. A questão é que todos aqui fazem uma escolha. A minha escolha foi a de ser eu independente das circunstâncias, só eu: sem máscaras, sem fingimentos ou arrependimentos, vivendo a minha vida e fazendo força para deixar claro que se a vida é uma só devemos fazer de cada um de nós o instrumento para transformar o próprio ato de viver em uma obra de arte cheia de beleza e alegria (não confundir com nenhum utopismo, já que sabemos o quanto o sofrimento é indissociável do ato de existir).
         Eu aqui deitado na cama com os meus cachinhos sobre os olhos, vou pensando em muitas coisas enquanto escrevo tudo isso. A tarde está quente, meus olhos estão cheios de lágrimas que me embaçam a vista e eu tenho um certo medo de nunca ser entendido, mas fiz minha escolha, serei o que quero enquanto estiver respirando, e o desconforto desses fatos nunca irá me impedir de dizer o que penso ou mostrar quem eu sou. Minha questão, se você leu isso, se entendeu a urgência que se apresenta junto ao ato de existir tendo consciência de si e de tudo que lhe cerca é: E quanto a você?