Me deixo cair na cama.
Estou tão cansado de tanta coisa que dificilmente teria disposição
para listar detalhadamente o que me aflige ou falar do sufoco que é
dar um sorriso. Eu nunca soube mesmo estar de cara amarrada e isso
para quem me conhece não é lá algo muito surpreendente. Entretanto,
justamente para não expôr ninguém a um turbilhão de emoções de
caráter duvidoso, achei que deveria fazer o máximo possível para
me manter um tanto apagado, distante, em certo estado de anestesia.
Tem música tocando lá
fora, música vulgar que fala de como somos engraçados e ligados
diretamente ao que o padrão social nos pede. Eu venho fugindo disso
faz anos...Eu não quero me encaixar, não quero ser assim rotulável,
igualzinho, usando terno e gravata e tendo um cabelo de cidadão
respeitável. Antes a bagunça dos meus cachinhos e o caos dos meus
pensamentos. Antes a dor de entender exatamente o que não desejo ser
e a sobriedade de olhar o mundo como quem observa de uma janela alta.
Eu tenho observado as
pessoas. Sabe, a maioria pensa que a vida é simplesmente um estado
de adequação às coisas: “Nasça, cresça, estude, arrume um bom
emprego, tenha uma namorada, constitua família, se adeque, faça
parte de algo...” entretanto, a maioria das pessoas ignora o fato
de que é profunda e irremediavelmente infeliz usando desculpas de
terno gravata para não fazer o que suas almas pedem.
Eu conheço advogados
que queriam ser músicos, contadores que queriam ser atores,
professores que um dia sonharam em contemplar a existência e hoje,
entretanto, estão levando uma vida que as vezes parece não ser
sua... Isso me chateia muito. Sabe, e eu nem consigo falar daqueles a
quem os muros da ignorância e injustiça privam da liberdade de pelo
menos entender o que querem; Nem consigo falar dos analfabetos e
miseráveis, eu nem sei mais falar...
O que eu sei e
pretendo deixar claro para quem ler isto é que vivemos uma só vez,
e se não pudermos fazer da nossa vida algo de que gostemos, pelo
menos em alguns pontos, devemos parar e ver para quê estamos
vivendo. A questão é que todos aqui fazem uma escolha. A minha
escolha foi a de ser eu independente das circunstâncias, só eu: sem
máscaras, sem fingimentos ou arrependimentos, vivendo a minha vida e
fazendo força para deixar claro que se a vida é uma só devemos
fazer de cada um de nós o instrumento para transformar o próprio
ato de viver em uma obra de arte cheia de beleza e alegria (não
confundir com nenhum utopismo, já que sabemos o quanto o sofrimento
é indissociável do ato de existir).
Eu aqui deitado na
cama com os meus cachinhos sobre os olhos, vou pensando em muitas
coisas enquanto escrevo tudo isso. A tarde está quente, meus olhos
estão cheios de lágrimas que me embaçam a vista e eu tenho um
certo medo de nunca ser entendido, mas fiz minha escolha, serei o que
quero enquanto estiver respirando, e o desconforto desses fatos nunca
irá me impedir de dizer o que penso ou mostrar quem eu sou. Minha
questão, se você leu isso, se entendeu a urgência que se apresenta
junto ao ato de existir tendo consciência de si e de tudo que lhe cerca
é: E quanto a você?